O contrato é a maneira segura de formalizar um acordo. É
bom para quem oferece o serviço e para quem o contrata, pois constitui prova
física que pode ser utilizada judicialmente. Nele estão descritas as obrigações
de cada um e os procedimentos a serem adotados em certas situações. Mas nem
tudo é perfeito. Em alguns contratos existem cláusulas que acabam dando muita
dor de cabeça ao contratante.
As
cláusulas abusivas são aquelas que geram desvantagens ou prejuízos para o
consumidor, em benefício do fornecedor. Alguns exemplos: diminuir a
responsabilidade do contratado, no caso de dano ao consumidor; obrigar somente
o contratante a apresentar prova, em um processo judicial; permitir que o
fornecedor modifique o contrato sem autorização do consumidor; estabelecer
obrigações para outras pessoas, além do contratado ou contratante, pois o
contrato é entre eles.
Essas
cláusulas têm sido encontradas em vários tipos de contrato, como nos de adesão,
que impõem cláusulas preestabelecidas por uma das partes, cabendo à outra
apenas aderir ou não ao estipulado. Veja nesse texto o que o Superior Tribunal
de Justiça (STJ) vem decidindo sobre o tema.
(...)
Restrição de
transplante
Ao julgar
o EREsp 378.863, a Segunda Seção manteve decisão da Terceira Turma que entendeu
não ser abusiva a cláusula de contrato de plano de saúde que exclui da
cobertura os transplantes de órgãos. A ação pretendia obrigar o plano de saúde
a custear transplante para um dos seus associados, que posteriormente veio a
falecer.
Os pais de
associado da Blue Life entraram com recurso no STJ pedindo que fosse
reconhecida como abusiva a cláusula contratual que excluía transplantes
heterólogos (introdução de células ou tecidos de um organismo em outro).
Alegou-se
ofensa ao Código de Defesa do Consumidor nos artigos 6º, que define os direitos
básicos do consumidor; 8º, que obriga que os produtos postos no mercado não
tragam prejuízos ou riscos à saúde do usuário, e 39, que veda práticas abusivas
dos fornecedores de produtos e serviços.
Também
teriam sido infringidos, no entender dos autores da ação, os artigos 46, 47
(que regulam contratos) e 51 (que veda cláusulas abusivas ou leoninas) do CDC e
os artigos 458 e 535 do Código de Processo Civil.
O relator,
ministro Humberto Gomes de Barros, considerou adequada a decisão que não
classificou a cláusula como abusiva. O associado teria entrado no plano de
livre vontade, com total consciência e as cláusulas de restrição seriam claras
o suficiente para o consumidor médio. Segundo o ministro Gomes de Barros, a
jurisprudência do STJ entende que, mesmo regidos pelo CDC, os contratos podem
restringir os direitos dos consumidores com cláusulas expressas e de fácil
compreensão. A decisão individual do ministro Gomes de Barros foi confirmada
pelos demais ministros da Terceira Turma.
Não
conformados, os pais do associado entraram com embargos de divergência na
Segunda Seção. Esse recurso é usado quando há decisões judiciais conflitantes
sobre a mesma matéria dentro do Tribunal. Eles alegaram haver entendimentos
diferentes na Terceira e na Quarta Turma e na própria Segunda Seção. A
tentativa foi rejeitada pelo ministro Jorge Scartezzini, o que levou a outro
recurso, dessa vez apreciado por todos os ministros da Seção. Com a
aposentadoria de Scartezzini, o caso foi distribuído ao ministro Fernando
Gonçalves.
Para os
ministros da Segunda Seção, a divergência apontada não foi demonstrada, pois
foram apresentadas apenas decisões da Terceira Turma. Para haver divergência,
as decisões devem originar-se de órgãos julgadores diferentes. Além disso, não
haveria semelhança nos fatos apontados nas decisões citadas, como exigem os
artigos 255 e 266 do Regimento Interno do STJ, já que se refeririam a situações
diferentes, como tratamento de Aids ou tempo de internação de paciente.
"Naqueles
casos as cláusulas eram dúbias, sendo que as cláusulas limitativas de direito
do consumidor deveriam ser redigidas com clareza e destaque", aponta a
decisão. Exatamente o que ocorria no contrato da Blue Life. Além disso, embora
o recurso não tenha sido acolhido, os ministros destacaram que a cláusula do
contrato que excluía da cobertura o transplante de órgãos não era abusiva.
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